quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Terapia do abraço

Com o irmão o abraço é sempre na medida (Jan. 2016)

Eu considero o abraço a melhor manifestação física de carinho entre pessoas. O beijo, como cumprimento, é quase um padrão de comportamento esperado; pode ser agradável, mas não me surpreende. Abraçar requer qualquer intimidade, afeto e enfrentamento de risco.

Há poucos dias acabei de ler "Uma Menina Estranha - autobiografia de uma autista", de Temple Grandin e Margaret M. Scariano. É um livro interessante e pretendo dedicar um post inteiro a ele na próxima semana; por enquanto, posso extrair um trecho que vai me auxiliar um tanto no texto de hoje. 

"Ansiava por ser tocada - abraçada. Ao mesmo tempo fugia dos excessos tácteis (...) Mesmo ser tocada por minha professora era uma coisa que me incomodava e fazia com que eu me retraísse (...) Nossos corpos pedem o contato humano, mas quando ele se estabelece, nós nos retraímos, porque nos provoca dor e confusão", p. 37/38. 

Muitas crianças autistas são sensíveis ao toque de outra pessoa; algumas se comportam como se estivessem recebendo uma pequena descarga elétrica. Já me perguntei diversas vezes qual será o motivo disso acontecer. A Teoria da Integração Sensorial é uma reação a essa sensibilidade e geralmente está presente nas sessões de terapia ocupacional. Através dela a criança pode perceber, aprender e organizar sensações recebidas do seu corpo e do meio*. 

Meu filho gosta de abraçar, está sempre me pedindo aconchego. Recebe em casa, desde pequenino, o que agora resolvi nomear de "terapia do abraço". Isso não quer dizer que ele se comporte naturalmente durante o ato, especialmente se o carinho vem de alguém que não o pai ou eu. Mesmo quando me abraça não chega a ser intenso - no sentido de saber usar a força muscular no tom adequado (ao menos que eu esteja de costas para ele); é como se não conseguisse apertar tanto quanto deseja. De outro modo, ele tem a necessidade de ser pressionando enquanto é abraçado, e usa o reforçador "aperte", para que eu o abrace com mais vigor ainda. 

Como tem dificuldade de interação com outras crianças, abraçá-las é quase um ato mecânico obedecendo ao comando de um adulto. Um momento rápido, pouco intenso, mas que ele já reconhece como convenção social. O que, diga-se de passagem, é um bom começo. Se é um adulto que lhe pede o carinho é comum que ele dê as costas a medida em que se aproxima do corpo do outro (uma espécie de "abraço de ré"). Como se tolerasse ser abraçado, não abraçar.

Apesar dessas limitações atuais, que atribuo à questão da integração sensorial, abraçar e receber o abraço de Bento vai ser sempre a melhor terapia para mim. Tenho certeza que quanto mais ele tomar conhecimento das próprias reações corporais, à medida em que for amadurecendo, essa será mais uma atitude a se tornar espontânea. De qualquer forma, eu abraço meu filho muitas vezes ao dia, não para que ele compreenda o que isso significa simbolicamente, mas para que ele sinta o quanto o amo e o quanto desejo tê-lo sempre assim, pertinho de mim.

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*Fonte e mais informações http://www.universoautista.com.br/autismo/modules/sections/index.php?op=listarticles&secid=17

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